A
chegada da cultura de massa, porém, acaba submetendo
as demais “culturas” a um projeto comum e homogêneo
ou pelo menos pretende essa submissão. Por ser produto
de uma indústria de porte internacional (e, mais tarde,
global), a cultura elaborada pelos vários veículos
então surgentes esteve sempre ligada intrinsecamente
ao poder econômico do capital industrial e financeiro.
A massificação cultural, para melhor servir
esse capital, requereu a repressão às demais
formas de cultura de forma que os valores apreciados passassem
a ser apenas os compartilhados pela massa.
A
cultura popular, produzida fora de contextos institucionalizados
ou mercantis, teve de ser um dos objetos dessa repressão
imperiosa. Justamente por ser anterior, o popular era também
alternativo à cultura de massa, que por sua vez pressupunha
originalmente ser hegemônica como condição
essencial de existência.
O
que a indústria cultural percebeu mais tarde (e Adorno
constatou, pessimista), é que ela possuía a
capacidade de absorver em si os antagonismos e propostas críticas,
em vez de combatê-lo. Desta forma, sim, a cultura de
massa alcançaria a hegemonia: elevando ao seu próprio
nível de difusão e exaustão qualquer
manifestação cultural, e assim tornando-a efemêra
e desvalorizada.
A
“censura”, que antes era externa ao processo de
produção dos bens culturais, passa agora a estar
no berço dessa produção. A cultura popular,
em vez de ser recriminada por ser “de mau gosto”
ou “de baixa qualidade”, é hoje deixada
de lado quando usado o argumento mercadológico do “isto
não vende mais” depois de ser repetida até
exaurir-se de qualquer significado ideológico ou político.
No
contexto da indústria cultural da qual a mídia
é o maior porta-voz são totalmente distintos
e independentes os conceitos de “popular” e “popularizado”,
já que o grau de difusão de um bem cultural
não depende mais de sua classe de origem para ser aceito
por outra. A grande alteração da cultura de
massa foi transformar todos em consumidores que, dentro da
lógica iluminista, são iguais e livres para
consumir os produtos que desejarem. Dessa forma, pode haver
o “popular” (i.e., produto de expressão
genuína da cultura popular) que não seja popularizado
(“que não venda bem”, na indústria
cultural) e o “popularizado” que não seja
popular (vende bem, mas é de origem elitista).
Questões
sobre a Cultura Popular
Quem
ou o que determina a cultura popular e qual a sua origem?
Ela surge do próprio povo como expressão autônoma
de seus interesses e de suas experiências, ou é
imposta por aqueles que detêm o poder, como forma de
controle social? E ainda: emerge das “classes inferiores”
ou vem “de cima” das elites, ou será mais
apropriadamente uma questão de interação
entre as duas?
Será
que o surgimento da cultura na forma de mercadoria prioriza
os critérios de rentabilidade e de negociação
em detrimento da qualidade, do talento artístico, da
integridade e do desafio intelectual? Ou será que a
expansão do mercado assegura seu caráter genuinamente
popular porque tornou acessíveis mercadorias que o
povo realmente deseja? Ou ainda, o que prevalece quando a
cultura popular é manufaturada industrialmente e comercializada
de acordo com os critérios de mercado?
A
cultura popular serve para doutrinar o povo? Para induzi-lo
a aceitar e a aderir a idéias e valores que assegurem
a continuidade da dominação daqueles que exercem
o poder? Ou representa revolta e oposição a
ordem social predominante? Será que expressa, de alguma
maneira, uma imperceptível, sutil e incipiente resistência
ao poder e a subversão das formar dominantes de pensamento
e ação?
Essas
questões ainda estão muito presentes no estudo
da cultura popular, mas assim como outras, receberam uma atenção
sistemática e considerável nas discussões
sobre cultura de massa que começaram a crescer a partir
dos anos 1920. As décadas de 1920 e 1930 foram decisivas
para o estudo e a avaliação da cultura popular.
O
advento do cinema e do radio, a produção e o
consumo de massa, a ascensão do fascismo e o amadurecimento
das democracias liberais em certos países ocidentais
contribuíram para definir os rumos dos debates sobre
cultura de massa. Produtos culturais como filmes de cinema
não são produzidos em larga escala como automóveis,
já que relativamente poucas cópias são
necessárias para se atingir uma grande audiência.
A
existência de meios muito eficientes para atingir um
grande número de pessoas em sociedades com regimes
políticos totalitários foi considerada por muitos
uma maneira a mais juntamente com a coerção
- de fortalecer tais regimes e de suprimir alternativas democráticas.
Os meios de comunicação como o radio e o cinema
transmitiam a ideologia oficial do regime fascista porque
permitiam o controle centralizado e alcançavam um público
enorme.